Cavaco Silva fez hoje um interessante discurso nas cerimónias oficiais das comemorações do 25 de Abril no Parlamento.
Começou ele assim:
Não vou repetir o que aqui afirmei o ano passado. Apenas direi que me impressiona que muitos jovens não saibam sequer o que foi o 25 de Abril, nem o que significou para Portugal. Os mais novos, sobretudo, quando interrogados sobre o que sucedeu em 25 de Abril de 1974 produzem afirmações que surpreendem pela ignorância de quem foram os principais protagonistas, pelo total alheamento relativamente ao que era viver num regime autoritário.
Não poderia estar mais de acordo, sendo eu por deformação professor de História antes de qualquer outra coisa polivalente e generalista que me obriguem a fazer.
Continuando de forma algo incisiva, O PR interpelou os políticos presentes e responsabilizou-os pelo alheamento dos jovens em relação à política e evocou um estudo que encomendou para demonstrar como a juventude tem escassos conhecimentos sobre a vida política:
O estudo colocou aos inquiridos três perguntas muito simples: qual o número de Estados da União Europeia, quem foi o primeiro Presidente eleito após o 25 de Abril e se o Partido Socialista dispunha ou não de uma maioria absoluta no Parlamento. Pois, Senhores Deputados, metade dos jovens entre os 15 e os 19 anos e um terço dos jovens entre os 18 e os 29 anos não foi sequer capaz de responder correctamente a uma única das três perguntas colocadas. Repito: metade dos jovens entre os 15 e os 19 anos não foi capaz de responder a uma única de três perguntas simples que lhes foram colocadas. No dia em que comemoramos solenemente o 34º aniversário do 25 de Abril, numa cerimónia todos os anos repetida, somos obrigados a pensar se foi este o futuro que sonhámos.
Na transmissão televisiva a que assisti, houve um momento em que as declarações do PR foram intercaladas com um plano da nossa Ministra e do nosso ex-Ministro Santos Silva, numa insinuação visual longe de subtil.
Efectivamente, há falhas na Educação a este nível. A rapaziada realmente não tem muito interesse em saber se são 7, 27 ou 77 países na União Europeia e provavelmente pensa que o Ramalho Eanes nunca existiu ou então foi um qualquer descobridor quatrocentista. Se o PS tem maioria ou não? Who cares?
Não é possível negar o défice notório de conhecimentos a este nível.
Como não me apetece enveredar por considerações vagas, vou pelo caminho corporativista, directamente ao que acho ter sido uma opção errada na organização curricular do nosso sistema educativo básico (a qual parece que se pretende reforçar brevemente) e que passa pelo acréscimo de horas que os alunos passam na Escola, mas por uma diminuição do que eu consideraria ser a «carga útil» desse horário. Com o apoio dum grupo restrito de «pais» que falam em nome de todos e que querem os filhos horas a fio na escola, mas para serem entretidos.
Ou seja, os alunos têm mais horas de ocupação obrigatória, mas essa ocupação foi enviesada pela introdução das ACND nos 2º e 3º CEB, em detrimento das horas dedicadas ás disciplinas propriamente ditas. No 3º CEB istoi foi ainda agravado por uma atomização curricular que tornou perfeitamente irracional a carga horária de algumas dessas disciplinas.
Por interesse pessoal e relevância para o assunto abordado pelo PR, tomemos o exemplo da História, disciplina actualmente mal vista pelos responsáveis políticos e espremida no currículo do 3º CEB.
Como é possível, por vezes com um bloco semanal equivalente ao tempo concedido a Estudo Acompanhado ou a Área de Projecto, trabalhar com os alunos de forma produtiva uns belos milhares de anos de História? Aliás as ACND têm tanto crédito horário semanal como as Ciências Sociais e Humanas!
Ah e tal, podem sempre usar aquelas ACND para compensar isso.
Errado. A obsessão actual é com a Língua Portuguesa e especialmente a Matemática por causa do PISA. E, para além disso, não seria mais útil aos alunos aprenderem História nas aulas de História de forma coerente e articulada?
Mas não: temos muito interesse em desenvolver habilidades, mas pouco em dar-lhes substância. Algo em que se basear. Capacidade de - mais do que recolherem informação na Wikipedia e imprimi-la directamente - organizarem de forma selectiva e crítica o que recolhem.
Claro que não sabem quantos estados tem a UE. Afinal o que interessa isso? Mas qual a vantagem em saber quem foram ou são os detentores de cargos políticos para além do óbvio: o Sócrates, o Cavaco, etc! só se der pontos para ganhar um pacotes de sms à borla.
Mesmo na Escola isso é subalternizado e periférico para o Sucesso.
Portanto, enquanto não se fizer uma distinção clara entre o essencial e o acessório no currículo escolar e se optar pelo desejo do sucesso estatístico e não pela consolidação das aprendizagens fundamentais (mesmo que nos chamem conservadores), quaisquer estudos que se façam continuarão a ter este tipo de resultados. Nem há maneira das coisas se apresentarem de outra forma.
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